Por Paulo Henrique Chignall, integrante do PET Economia UFF

A Medida Provisória nº 1.300/2025, assinada pelo presidente Lula em 21 de maio, reúne um conjunto abrangente de alterações na legislação do setor elétrico. O texto trata de temas como abertura do mercado de energia para todos os consumidores, regras para autoprodução, separação entre atividades de distribuição e comercialização, e a criação de um Supridor de Última Instância. No entanto, um dos pontos de maior impacto direto para a população é a reformulação da política de isenção na conta de luz para famílias de baixa renda.

A Medida Provisória institui duas novas faixas de isenção na conta de luz para ampliar a proteção às famílias de baixa renda. A primeira delas altera as regras da Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE), que atualmente concede descontos parciais escalonados conforme o nível de consumo. Com a nova norma, todas as famílias enquadradas na TSEE, ou seja, inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) com renda per capita de até meio salário-mínimo, passarão a ter gratuidade total na tarifa de energia para o consumo mensal de até 80 kWh. Isso significa que, por exemplo, uma família que consumir 100 kWh em um mês pagará apenas pelos 20 kWh excedentes, tornando o benefício mais direto, previsível e acessível.

Além disso, a MP cria uma segunda camada de isenção: famílias também inscritas no CadÚnico, mas com renda mensal per capita entre meio e um salário-mínimo, terão isenção do pagamento das quotas anuais da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) sobre o consumo mensal de até 120 kWh. Essa nova isenção não zera a tarifa, mas reduz o valor total da conta ao eliminar os encargos setoriais incidentes nessa faixa de consumo.

As duas medidas são complementares e acumulativas. Famílias que se enquadrarem em ambos os critérios, ou seja, beneficiárias da TSEE e com registro atualizado no CadÚnico, terão gratuidade total até 80 kWh e, no consumo entre 81 kWh e 120 kWh, continuarão pagando a tarifa de energia, mas estarão isentas das cobranças da CDE. Segundo estimativas do Ministério de Minas e Energia, essa nova política pode beneficiar até 21 milhões de famílias, o que representa cerca de 55 milhões de pessoas, com uma redução média de até 11,8% na conta de luz desse grupo.

O financiamento das novas isenções previstas na MP será feito por meio da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Os valores correspondentes às gratuidades e descontos da tarifa serão compensados dentro do próprio fundo, por meio da criação de um encargo tarifário adicional. Esse encargo será rateado entre os demais consumidores do sistema interligado nacional, de forma proporcional ao consumo de energia. Na prática, isso significa que a ampliação dos benefícios sociais será sustentada por uma redistribuição dos custos dentro da estrutura tarifária já existente.

Nesse sentido, a nova política de isenção representa uma medida de natureza eminentemente econômico-social, voltada à proteção de famílias que enfrentam dificuldades para custear o consumo básico de energia elétrica. Ao garantir a gratuidade da tarifa para a faixa mais pobre da população, o programa atua diretamente sobre um dos componentes mais sensíveis do orçamento doméstico das camadas mais pobres: o custo da energia. 

Para milhões de famílias brasileiras, especialmente nas regiões mais periféricas e em áreas com menor infraestrutura, essa medida pode significar a diferença entre o uso contínuo e seguro da eletricidade ou a necessidade de restrições severas, além de um alívio para alocação do orçamento em outras necessidades essenciais. Trata-se, portanto, de uma política que busca não apenas aliviar despesas, mas assegurar condições mínimas de dignidade e inclusão, enfrentando de forma estruturada o fenômeno da pobreza energética.

Apesar da relevância social da medida, sua estrutura redistributiva pode gerar reações adversas entre os consumidores que não serão diretamente beneficiados, em especial os da classe média. Como o financiamento das isenções se dará por meio de um novo encargo incluído na conta de luz, parte do custo será repassada para os consumidores da classe média que estão fora dos critérios de elegibilidade, mas ainda enfrentam pressões orçamentárias relevantes.

Esse grupo, que frequentemente já absorve aumentos de preços em serviços públicos sem compensações diretas, pode perceber a elevação da fatura de energia como um ônus adicional. O risco, nesse contexto, é que a medida, embora socialmente justificável, gere insatisfação por parte de quem arca com o encargo, acirrando o debate público sobre justiça tarifária, focalização de subsídios e a transparência na definição dos critérios de quem paga e quem recebe.

A Medida Provisória já está em vigor, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional no prazo de até 120 dias para se converter em lei. Durante a tramitação, o texto pode ser alterado por emendas parlamentares, e sua efetiva implementação dependerá de regulamentações técnicas que ainda serão emitidas pela agência reguladora ANEEL.

Referências:

Medida Provisória nº 1.300/2025. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2025/Mpv/mpv1300.htm

Perguntas e Respostas: Reforma do Setor Elétrico, MME. Disponível em: https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/noticias/presidente-lula-assina-mp-que-reformula-tarifa-social-de-energia-eletrica-e-abre-mercado-para-todos-os-consumidores/PerguntaseRespotasReformadoSetorEltricoMME.pdf

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