ARTIGO 1

FOLHA DE SÃO DOMINGOS

O Jornal do PET Economia UFF

Períodos pandêmicos reduzem taxa de informalidade do mercado de trabalho e aumentam renda média real. Contudo, nem sempre o que parece bom, o é… Breve análise*.    

Marcus Galera Lobo; 12/05/2023

Tal como definido pelo IBGE, compreendendo as categorias de empregados no setor privado (incluindo trabalhadores domésticos) sem carteira de trabalho assinada, empregadores e conta própria sem CNPJ, bem como trabalhadores familiares auxiliares, verifica-se que, em proporção ao número total de ocupados, os informais constituem parcela significativa, com média de 39,8% nos últimos seis anos (2016q3 a 2022q3).

Analisando sua evolução histórica desde o início da série (2015q4), conforme Gráfico 1 abaixo, é possível observar a pequena tendência de crescimento dessa proporção impressa de 2015q4 a 2019q3, com média trimestral de 0,63% no período.

No decorrer1 da Pandemia de Covid-19, e em especial no segundo trimestre de 2020, registraram-se proporções historicamente inferiores às registradas pré-pandemia, fato que, em um primeiro momento, poderia soar contra intuitivo. Contudo, uma análise um pouco mais abrangente do fenômeno, através, por exemplo, das taxas de crescimento do nível total de ocupados e de informais, expressa em sequência no Gráfico 2, revela que o setor informal pode possuir maior sensibilidade aos ciclos do mercado de trabalho, tendendo a crescer proporcionalmente mais em períodos de aquecimento e, da mesma forma, cair proporcionalmente mais em períodos de contração do mercado. 

Assim, em destaque ao segundo trimestre de 2020, por exemplo, o qual apresentou o maior desvio relativo à série histórica, verifica-se uma queda do número total de ocupados de 9,73%, enquanto os informais registraram queda de 16,54%. Tal discrepância, pois, tende a evidenciar que os efeitos da pandemia recaíram com maior vigor no setor informal e, dessa forma, foi responsável por diminuir a porcentagem de informais em relação ao total de emprego totais, o que não significa, dessa forma, o que poderia ser uma benéfica migração de categoria de ocupação.

A partir de 2020q3 retorna-se ao crescimento da taxa de informalidade, atingindose, em 2021q3, a proporção verificada em 2019q4, com 40,6%. Observa-se, ainda, que tal expansão, ocorrida até 2021q4, fez-se a taxas trimestrais de crescimento superiores às do crescimento da ocupação total, reforçando a inferência anteriormente apresentada sobre a aparente maior sensibilidade do setor informal aos ciclos do mercado de trabalho.

Complementarmente, dadas sazonalidades existentes no mercado de trabalho e evidentemente expostas nestas séries de crescimento trimestral (Gráfico 2), uma análise de crescimento em termos interanuais deflagra ainda mais o até então exposto, vide Gráfico 3 a seguir:

Em termos absolutos, contudo, de 2022q1 até 2022q3, embora tenham crescido tanto o nível de ocupação total (de 95,275 milhões de ocupados em 2022q1 para 99,269milhões em 2022q3), como o da informalidade (de 38,203 milhões em 2022q1 para39,145 milhões em 2022q3), verifica-se queda na taxa de informalidade relativa (vide Gráfico 1). Tal fenômeno recente, pois, diferente do observado durante 2020 e descrito anteriormente, poderia indicar uma benéfica movimentação de categoria de emprego, com a maior criação, tanto absoluta como relativa, de postos no mercado formal. Ressalta-se, entretanto, que tal análise, no objetivo deste relatório, ainda se faz de forma bastante preliminar, enquanto demais dados poderiam ser avaliados em busca de melhor compreensão do fenômeno.

Em sequência, outra variável interessante de se observar no tempo ao analisar os reflexos da pandemia no mercado de trabalho é o Rendimento Real Habitualmente Recebido, isto é, o rendimento bruto recebido por todas as categorias de ocupação com rendimentos (empregados, empregadores e trabalhadores por conta própria), deflacionado pelo IPCA – IBGE e sem acréscimos extraordinários ou descontos esporádicos.

Assim, analisando a série histórica desde o trimestre móvel findo em março de 2012, tanto em termos de Massa de Rendimento (soma dos rendimentos brutos habitualmente recebidos), como em termos de Rendimento Médio (massa de rendimentos ponderada pelo total de ocupantes com rendimentos), observável em sequência através do Gráfico 4, diversos pontos fazem-se notórios. Entre eles, o fato de que, atualmente (trimestre móvel findo em nov/22) registramos rendimento médio real semelhante ao verificado nove anos atrás2, embora com massa de rendimentos reais aproximadamente 11,7% superior em comparação ao mesmo período.

Outro fator de destaque, complementar à análise imediatamente anterior e ilustrado através do Gráfico 5, no que seguirá, é de que, ainda no período pré pandêmico, por um período de cinco anos (de dez/143 a dez/19), verificamos média de 0.0% na taxa de crescimento interanual4do rendimento médio real habitual.

Já em relação ao período pandêmico, em seu primeiro ano, de mar/2020 a mar/2021, sobressai-se que registramos sucessivos valores positivos nas taxas de crescimento interanuais do rendimento, fato que também deve ser interpretado com cautela: ao observarmos, em consonância, a evolução da massa de rendimento real, compreendemos que, para tal período, houve queda interanual de 6,2% (em valores absolutos, de R$ 260,06 bilhões em mar/20 para R$ 243,89 bilhões em mar/215), o que nos dá indícios de que a massa de rendimentos perdida tenha se originado, em maior parcela relativa, da população com rendimentos inferiores à média, em relação ao mesmo período do ano anterior.

Adicionalmente, retomando a análise ao Gráfico 4, pode-se perceber a correlação positiva entre o rendimento médio e a massa de rendimentos, verificada de mar/2012 ao final de 2019 (registra-se um índice de correlação de 0,9019 entre essas pelo período de mar/2012 a dez/2020). Nos primeiros trimestres móveis de 2020, portanto, com o início da pandemia, verifica-se a completa inversão, com a uma correlação de – 0,9830 entre jan/2020 e nov/2020, ou seja, reafirmando o entendimento apresentado no parágrafo anterior de que, apesar da queda da massa de renda real, verificou-se o aumento da renda real média, a partir da qual pode-se apreender que a parcela dos ocupados com rendimentos mais impactados, principalmente em 2020, foi daqueles com menores rendimentos, elevando, portanto, a média.

Por outro lado, a taxa de crescimento interanual dos rendimentos médios reais habituais totais passa a ser negativa em abr/2021, assim permanecendo até ago/2022, o que, inversa e analogamente, nos dá indícios de que a recuperação de postos de trabalho neste período (observáveis, por exemplo, através de dados conhecidos do aumento da população ocupada no período) tenha sido em maior medida representada pela recuperação dos postos de baixo rendimento (em relação à média), de forma que as médias de rendimentos reais tenham sido inferiores às registadas no mesmo período do ano anterior.

Em termos absolutos e contínuos, entretanto, conforme expresso no Gráfico 4 (isto é, apartando ao comportamento interanual), a partir de jan/2022 verifica-se um aparente retorno da correlação positiva entre rendimento médio e a massa de rendimentos reais (índice de correlação de 0.9713 entre jan/22 e nov/22).

Por fim, recentemente, observa-se o rendimento médio real em níveis próximos aos verificados pré-pandemia (rigorosamente, em nov/22, com R$ 2.707,00, ainda 1,2% inferior ao verificado em fev/20, com R$ 2.741,00) simultaneamente a uma massa de rendimentos reais 4,1% superior para os mesmos períodos (R$ 272,998 bilhões em nov/22 versus R$ 262,197 bilhões em fev/20), o que poderia indicar um aprofundamento das desigualdades distributivas6 sofrido nesse intervalo.

Assim, com base nos dados apresentados, evidencia-se que os efeitos da pandemia no mercado de trabalho (com as grandes flutuações nos níveis e taxas de desemprego) recaíram, com mais força, ao setor informal e àqueles com menor rendimento médio real, mostrando-se esses mais sensíveis aos ciclos desse mercado. Adicionalmente, pondera-se que, embora tal elasticidade também contribua à recuperação, mais vigorosa, destas categorias frente ao progressivo restabelecimento dos níveis de atividade, tal recuperação aparenta ocorrer juntamente a um agravamento das assimetrias de rendimentos.

Assim, com base nos dados apresentados, evidencia-se que os efeitos da pandemia no mercado de trabalho (com as grandes flutuações nos níveis e taxas de desemprego) recaíram, com mais força, ao setor informal e àqueles com menor rendimento médio real, mostrando-se esses mais sensíveis aos ciclos desse mercado. Adicionalmente, pondera-se que, embora tal elasticidade também contribua à recuperação, mais vigorosa, destas categorias frente ao progressivo restabelecimento dos níveis de atividade, tal recuperação aparenta ocorrer juntamente a um agravamento das assimetrias de rendimentos.

* Relatório alusivo aos dados de ocupação, informalidade, e rendimentos do mercado de trabalho (PNAD Contínua – IBGE), com corte no trimestre móvel findo em nov/22.

1 Poder-se-ia dizer, mais detidamente, analiticamente em relação ao período de, e inclusive, 2020q1 a 2021q2. Em 2021q3, com proporção da informalidade de 40.6%, resgatou-se o observado em 2019q4.
2 Rigorosamente: o trimestre móvel findo em nov/22 apresentou rendimento médio real de R$ 2.707,00, exatamente a mesma monta verificada no trimestre móvel findo em out/13. Em novembro/13, o rendimento médio real foi de R$ 2.696,00.
3 Pela fluidez da escrita, leia-se que as referências mensais fazem alusão aos dados com divulgação em periodicidade mensal (IBGE) dos trimestres móveis findos no mês explicitado. Assim, por dez/14, por exemplo, entende-se o trimestre móvel de out-nov-dez/2014.
4 Aquela avaliada em relação ao mesmo período do ano anterior.
5 Registra-se, ainda, que a massa do rendimento habitual real continuaria a cair até dez/2021, atingindo a monta de R$ 241,65 bilhões.
6 Notadamente, também se poderia apreender semelhante conclusão ao período de fev/17 a fev/20, o qual imprimiu, em termos reais, crescimento de 9,6% à massa de rendimentos, frente a 2,4% da renda média.

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